O desafio de mudar para melhor passa pelo Cérebro
Janeiro 16, 2023
Os convido a ler estes versos de Alberto Caiero de seu poema Nem Sempre Sou Igual (O Guardador de Rebanhos):
Nem sempre sou igual no que digo e escrevo
Mudo, mas não mudo muito.
A cor das flores não é a mesma ao sol
De que quando uma nuvem passa
Ou quando entra a noite
E as flores são cor da sombra.
Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
Por isso quando pareço não concordar comigo,
Reparem bem para mim:
Se estava virado para a direita,
Voltei-me agora para a esquerda,
Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés-
O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
E aos meus olhos e ouvidos atentos
E a minha clara simplicidade de alma
Tudo indica que Fernando Pessoa, o transcendental poeta português entendia como ninguém a mente humana, Alberto Caiero é um dos seus heterónimos, talvez o mais conhecido.
Na verdade sempre se falou que poetas, escritores, pintores e outros artistas são profundos conhecedores da ‘alma” humana e até agora nada existe de mais fiel depositária e matriz da alma humana que aquilo que conhecemos como mente.
Quantas vezes escutamos esbravejar “eu nunca mudei meu pensamento”, como se isso fosse um grande mérito um sinónimo de supremacia moral, um atributo que capacita para comandar aos outros. Ledo engano.
O que as neurociências comprovaram nas últimas décadas é que nosso cérebro está em constante mudança, não digo constante evolução porque nesse caminho e principalmente quando atingidos pelo radicalismo podemos afirmar sim que o risco de involução também existe e atinge a muitos.
O cérebro humano funcionalmente é o mecanismo mais complexo que conhecemos, sendo que ainda temos muito a aprender sobre ele.
Nem o mais avançado e moderno sistema de supercomputadores consegue chegar perto do grau de sofistificação e eficiência do funcionamento cerebral.
Por isso a mente humana é considerada a máquina mais poderosa e refinada de que se tem noticia.
Em 2017 pesquisadores da Universidade de Lausanne, na Suíça, liderados pelo professor Henry Markram, descobriram que as redes cerebrais, conexões entre os bilhões de neurônios, são multidimensionais, muito além da conhecida tridimensionalidade, eles relataram até onze dimensões, algo inimaginável para nosso entendimento, temos dificuldade para entender uma quarta dimensão, imagina onze!.
Essa alta complexidade do nosso sistema nervoso parte de um principio genético simples: construir um equipamento flexível, que se adapte ao mundo.
Para nossa sorte nosso DNA não é um esquema fixo, na verdade é um sistema que reescreve continuamente suas cadeias através de mutações e outros mecanismos, dessa forma reflete as experiências e o ambiente onde se desenvolve o indivíduo.
É exatamente essa flexibilidade que faz com que a visão do mundo, a forma de solucionar problemas e enfrentar desafios possa ser completamente diferentes para um jovem indiano, para um chinês, um sulamericano ou um esquimó.
É também por isso que essa diversidade de ideias e de culturas pode ser muito benéfica para encontrar soluções aos pequenos problemas do dia a dia ou aos grandes desafios da humanidade.
Nossos neurônios se comunicam através de substancias químicas chamadas de neurotransmissores que geram potenciais elétricos, toda vez que chega qualquer tipo de informação no seu cérebro, seja visual, auditiva, leitura, etc. esse mecanismo neuroquímico e elétrico está sendo estimulado, assim em este exato momento alguma modificação por mínima que seja está acontecendo no seu cérebro.
Conhecedores de que todo e qualquer conhecimento, toda experiência é capaz de provocar modificações no nosso cérebro, na nossa essência, é de bom senso que procuremos e sejamos ávidos por informações e conteúdo de qualidade, por experiências de vida que agreguem valor a nossos dias e cuja somatória possa nos tornar pessoas melhores.
Nas últimas duas décadas a humanidade ficou muito mais exposta a ser contaminada pelas teorias conspiratórias, recentemente escutei de um adolescente que consome horas da sua vida assistindo vídeos no Youtube que “o homem nunca pisou na lua”, “está comprovado que a terra é plana”, e “que não existiu o holocausto”.
A internet está cheia de informações falsas e nossas mentes facilmente podem entrar nesse caminho de negar a realidade, até pelo simples fato de que “ser diferente” pode te tornar alguém mais interessante.
Dois terços dos jovens brasileiros de 15 anos que fizeram o PISA (exame internacional da OCDE) tem dificuldade em, diferenciar fatos de opinião na leitura de um texto. Assim fica aberto o caminho para o negacionismo, o charlatanismo e o empirismo.
A neurociência já comprovou que cada vez que adquirimos novas habilidades, as regiões do cérebro responsáveis por gerenciar esses novos conhecimentos ou destrezas aumentam tanto em volume quanto em número de conexões neuronais (sinapses).
Quando um advogado se aposenta e decide se dedicar em tempo integral aso seu hobby que é a entomologia (estudo dos insetos) com certeza seu córtex visual vai desenvolver uma resolução mais alta para os pequenos detalhes.
O contador que se aposenta para se dedicar diariamente a tocar acordeão terá seu córtex motor que controla os movimentos de seus dedos aumentado e constatará que ao longo do tempo sua técnica de execução está melhorando, seu córtex auditivo também se tornará maior e melhor.
Essa é a plasticidade dessa maravilhosa maquina cerebral.
É impressionante que o premio Nobel de 1906, Santiago Ramón y Cajal, talvez o maior neurocientista de todos os tempos, já intuísse que tudo isso era possível com nosso cérebro e tivesse afirmado ainda no século 19: “Todo homem pode ser, se assim desejar, o escultor de seu próprio cérebro”
A recomendação é para que sejamos seletivos, eficientes em separar o joio do trigo e alimentemos nosso cérebro com informações de qualidade, boa leitura, boa música, atividades ao ar livre que nos proporcionem prazer, paz e em definitiva melhorem nossa massa cinzenta.
Seu cérebro vai lhe agradecer.